Máscaras de tecido
Esta sou eu com uma das várias máscaras que fiz cá para casa. Não desenhei o molde, não é molde meu, há vários moldes grátis e tutoriais na internet.
A minha opinião pessoal acerca das máscaras é, desde o início da pandemia, que todos deviam usá-las. As máscaras como esta servem para proteger os outros (não o próprio) e, se todos usarem, todos ficamos protegidos. É aquele lema do "A minha protege-te e a tua protege-me".
Entretanto algumas amigas perguntaram-me se faço máscaras para vender. Não faço para vender. Tenho oferecido algumas à família e a amigos, doei para o lar de Linda-a-Velha, dei a alguns vizinhos e faço para nós.
Não vendo porque não tenho tempo, porque felizmente continuo a conseguir trabalhar no meu trabalho normal (o design de moldes e os cursos de costura online) e não tenho tempo (nem materiais) para mais nada.
Mas tenho amigas que vendem, e recomendo-as a quem me pergunta:
- A Dora: Colourbymim
- A Carla: Faz-de-Pontos
Já disse aqui várias vezes, e desde há bastante tempo, que acredito que todos devíamos usar máscara ao sair de casa. Se todos usassem, todos estariam mais protegidos. Seja máscara cirúrgica descartável, seja máscara xpto que não deixa passar vírus nenhum, seja máscara caseira feita em tecidos de algodão. A barreira à frente da boca e do nariz protege-nos a todos.
O que me deixa perplexa é porque é que as pessoas decidiram insultar e demonizar as costureiras. De repente as costureiras são uns seres horríveis que estão a lucrar com a desgraça dos outros, que deviam era doar todas as máscaras que fazem porque são um bem de primeira necessidade, e que é horrível estar a lucrar com isso.
Mas está tudo doido???
Pior ainda são aquelas costureiras que insultam as colegas de profissão. Eu já lhes chamo a Polícia das Máscaras (no meu antigo emprego havia uma colega a quem todos chamavam a Polícia do Time Management porque andava sempre a controlar os outros, apesar de não ser o trabalho dela. Ninguém gostava dela). Essas é que não entendo mesmo. Se não querem fazer para si não façam, mas andar a insultar quem faz, acusá-las de crimes de saúde pública, e dizer que vão denunciar à ASAE é inconcebível. Entendam uma coisa: se dentro de uma profissão as pessoas não se apoiarem mutuamente, fora da profissão ninguém as vai apoiar!
Todos os dias se vê pessoas a elogiar as empresas, negócios e fábricas que adaptaram as suas linhas de produção para produzir equipamentos de protecção individual. Isto é exactamente o que as costureiras também fizeram! Adaptaram-se para continuar a manter o seu negócio e o seu sustento. As clientes deixaram de procurar roupa, lancheiras, bonecas, e passaram a procurar máscaras. As costureiras adaptaram-se e passaram a produzir isso. É difícil de entender?
As empresas, fábricas e negócios que alteraram a sua produção não andam todas a doar o que produzem. Se assim fosse ia tudo à falência. Há que louvar quem se sabe reinventar e adaptar-se à realidade, adaptar-se à mudança:
As empresas pequenas que forneciam restaurantes e que agora vendem ao público em geral e entregam ao domicílio.
As fábricas que passaram a produzir EPIs em vez de roupa, ou viseiras em vez de o que quer que seja que produziam antes.
Os negócios que passaram a vender online.
Até a Makro que passou a abrir ao público em geral porque perdeu os seus clientes habituais, os restaurantes e cafés.
E as costureiras que passaram a vender o que sabem fazer bem: máscaras reutilizáveis.
"Ah e tal, deviam era doar tudo e não estar a lucrar com isso."
Mas as empresas passaram todas a doar tudo o que fazem? Os supermercados passaram a dar tudo grátis? As farmácias passaram a dar as máscaras gratuitamente (ou subiram os preços das mesmas?)? As fábricas passaram a dar o que produzem? Os chineses passaram a dar tudo grátis ao mundo depois de exportarem o vírus? Não!!! É óbvio que não.
A isto chama-se MANTER A ECONOMIA A FUNCIONAR. Os materiais custam dinheiro, as máquinas sofrem desgaste e precisam de peças novas e de manutenção, o tempo de cada um é valioso. Isto tanto é válido para a fábrica grande como para a costureira que precisa de ganhar o seu sustento e da sua família.
Fazer máscaras demora imenso tempo. Gasta tecidos, linhas, agulhas. Desgasta a máquina tal como os kilómetros desgastam um carro. Os tecidos ideais para as máscaras (de algodão, que se usam para patchwork) são caríssimos. As máquinas de costura custam muito dinheiro e a sua manutenção também. Porque raio é que se espera que as costureiras passem a trabalhar de graça?
Ainda por cima não há máscaras descartáveis suficientes no mundo para toda a gente. A solução vai inevitavelmente passar pelas máscaras caseiras feitas em tecido. Por isso há que apoiar as costureiras tal como se apoia todos os outros empresários (pequenos e grandes) que se estão a saber adaptar para poderem continuar a trabalhar. Não insultá-las.
Aqui em Portugal temos a sorte enorme de estarmos num país que se está a aguentar muito bem nesta calamidade actual. Estamos em estado de emergência, com as lojas, fábricas e muitos negócios fechados, enfiados em casa, com filas nos supermercados, mas muitos conseguem continuar a trabalhar, não há tanto desemprego como noutros países, a Seg. Social paga apoios a TODOS os que precisam, os imigrantes ilegais são levados de ambulância para serem tratados no SNS, o estado arranjou maneira de termos ensino doméstico para todos, muitos negócios continuam a funcionar em modo online, a poder fazer envios e entregas ao domicílio.
Estamos bem.
Temos muita sorte a comparar com a desgraça que é o resto do mundo neste momento. Sejamos boas pessoas.
Paralelamente a isto temos a DGS e o Ministério da Saúde cá em Portugal que, no meu entender, têm lidado com isto das máscaras muito mal. Esta semana finalmente admitiram que se deve usar máscaras em tecido. Mas como em tudo por cá, tiveram que complicar o assunto ao máximo. Então vejamos:
Para começar arranjaram um nome, porque tudo tem que ter um nome próprio para não misturarmos as coisas: máscaras comunitárias.
Depois anunciaram que iam publicar as instruções para se poder fazê-las como deve ser. Ficaram as costureiras todas coladas às notícias para ver o que ia sair.
Quando saiu, mais uma vez, são documentos escritos para a indústria, ou super complicados, escritos numa linguagem tão ou mais esquisita do que o "burdês".
O Infarmed escreveu um documento que não tem informação nenhuma útil. Refere muitas normas e coisas técnicas que, na prática, não servem de nada para a comum costureira e para o comum mortal.
Ao mesmo tempo o CITEVE publicou as fichas técnicas para o fabrico das máscaras comunitárias. Inclui 2 modelos (o habitual de pregas e o outro de pinças). Mas como é óbvio estão escritos para a indústria. Para além das medidas não incluem mais nada de verdadeiramente útil para quem não as vai fazer numa fábrica. Nem sequer ilustrações para a construção.
Ou seja, como tudo o que se faz oficialmente em Portugal, em vez de as autoridades simplificarem a situação, complicaram-na ainda mais e tornaram quase impossível para as costureiras independentes fazerem máscaras para vender. Exigências de pormenor de 70% de filtração de partículas e respirabilidade de 8/l min segundo. A sério??? Mas quem é que vai decifrar isto tudo? Se falarem em tipos de algodão e de tecidos com trama apertada ou larga as pessoas sabem o que é. Conversa técnica desta ninguém entende!
Ninguém se lembra que as milhares de costureiras deste país também pagam impostos e contribuem para a economia. Não são só as fábricas têxteis que são importantes para a economia. Tal como já disse antes as costureiras têm conhecimento, experiência e qualificações para produzirem máscaras comunitárias tal como as fábricas. Já para não falar das costureiras que TAMBÉM SÃO profissionais de saúde. Mas documentos e directivas absurdos como ss que saíram só lhes complicam a vida e impossibilitam-nas de trabalhar.
"Ah e tal, mas as máscaras devem ser certificadas." Devem? Por quem e porquê? Todos os telejornais mostraram vídeos a ensinar a fazer uma máscara ao melhor estilo MacGyver usando um lenço e 2 elásticos de cabelo, não foi? Então qual é o problema de uma pessoa ir ao supermercado com uma máscara dessas? Vai ser presa? Vai ser expulsa do supermercado se não tiver comprado uma máscara "com certificação"?
Dois dias depois das máscaras MacGyver o jornal da noite na SIC entrevistou o presidente da Associação do Têxtil e do Vestuário que dizia acerca dos testes com aerossóis aos tecidos: "Isto é um processo complexo."
Aí está! O complexo de inferioridade das pessoas (e instituições) que têm que fazer as coisas parecerem complexas para os outros os considerarem indispensáveis. Se algo for simples qualquer um pode fazer. Se eu fizer algo parecer muito complicado então os outros vão precisar de mim porque (supostamente) só eu é que sei fazer.
Em vários outros países quando a pandemia se começou a tornar séria publicaram logo instruções simples dirigidas à população em geral a ensinar como fazer máscaras. Até como as costurar à mão em casa. Mas cá tem que se complicar tudo para dar um ar sério!!! Porque se for simples as pessoas vão desconfiar e qualquer um as pode fazer. Por isso tem que se complicar tudo e assim só a indústria têxtil é que vai ter autorização para fazer.
Estou completamente farta disto tudo. No último mês já devo ter costurado perto de 100 máscaras. Experimentei vários moldes e escolhi o meu preferido. Não as vou fazer para vender, são para oferecer. Mas se quisesse fazer para vender, fazia.
Assim, para ajudar quem também as quer fazer, mesmo que seja para vender, deixo aqui em baixo uma lista de links para moldes, tutoriais e informações úteis, tudo de outros países obviamente porque é tudo simples e claro demais para se poder fazer cá (como as americanas dizem "this is why we can't have nice things.").
Esta publicação é a minha maneira de prestar um serviço público à população em geral que tem uma máquina de costura em casa. Fiquem seguros.
Uma última nota importante antes dos links:
Não me falem mais em TNT. Já não se pode com a conversa do TNT, parece que é a salvação do mundo. Não usei TNT em nenhuma máscara das que fiz.
TECIDOS: As máscaras podem ser feitas em tecidos de algodão com trama apertada como os que se usam para fazer patchwork, o quilting cotton. Devem ter um exterior e um forro de cores diferentes. Podem ter uma abertura para colocar um filtro descartável.
FILTROS possíveis: papel de cozinha, lenço de papel de bolso, toalhitas de limpeza secas, toalhitas agarra-pó. Tudo coisas que temos em casa. Não é preciso complicar.
ELÁSTICOS OU FITAS: pode-se usar:
- elástico estreito
- fitas estilo fita de viés mas sem ser cortada em viés para não se deformar
- trapilho
- tiras de malha jersey
- ou até atacadores
Links:
O meu molde preferido: craftpassion. Tutorial em vídeo.
Tutoriais: made_everyday. Tutorial em video.
Tutorial para fazer fitas em jersey.
Grupo português: Mascaraparatodospt
Grupo com vários moldes: Care Masks
Grupo inglês: maskmakersUK
CDC americano: diy-cloth-face-coverings
Grupo oficial belga: makefacemasks.com
Ministério da Saúde do Brasil: mascaras-caseiras
Mais outro tutorial brasileiro: mascaras-caseiras-seguras
Washington post: diy-face-mask-questions
Fiquem seguros.
Susana